sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

A Auto-Suficiência de Deus



(por A.W.Tozer)

O problema da razão pela qual Deus criou o universo ainda perturba os intelectuais; mas se não pudermos saber por que, pelo menos poderemos saber que Ele não trouxe os mundos à existência a fim de satisfazer alguma carência em Si mesmo, como o homem poderia construir uma casa para abrigar-se do frio do inverno ou plantar um campo de milho para se alimentar. A palavra “necessidade” é totalmente estranha a Deus.

Sendo Deus um Ser supremo e soberano, segue-se que não pode ser elevado. Não há nada acima dEle, nada além dEle. Para a criatura, qualquer movimento em direção a Deus é elevação, e para longe dEle é queda. Deus mantém por Si mesmo a Sua posição, e não precisa permissão de ninguém. Desde que não é possível elevar a Deus, assim também, é impossível degradá-lO. Está escrito que Ele sustenta todas as coisas por meio da palavra do Seu poder. Como então Ele pode ser elevado ou sustentado pelas próprias coisas que sustenta?

Se de repente todo ser humano se tornasse cego, o sol ainda estaria brilhando de dia e as estrelas de noite, pois nada devem aos milhões de pessoas que deles se beneficiam. Assim, se todo homem sobre a terra se tornasse ateu, não afetaria a Deus de forma alguma. Ele é quem é, em Si mesmo, sem precisar prestar contas a outro. Crer nEle não aumenta a Sua perfeição; duvidar dEle não O diminui em nada.

O Deus Todo-Poderoso, porque é poderoso, não precisa de apoio. O retrato de um deus nervoso e subserviente, adulando os homens a fim de ganhar o seu favor não nos agrada de maneira nenhuma; porém, se examinarmos o conceito popular de Deus, chegaremos precisamente a essa conclusão. O cristianismo do século vinte classificou Deus como “necessitado da nossa caridade”. Nossa opinião a nosso próprio respeito é tão presunçosa que achamos bem fácil, e mesmo agradável, acreditar que Deus precisa de nós. Mas a verdade é que Deus em nada engrandece pelo fato de existirmos, nem diminuiria se nós deixássemos de ser. Nossa existência é o resultado da determinação totalmente livre de Deus, e não a devemos ao nosso próprio merecimento nem à necessidade divina.

O pensamento mais penoso para o nosso egoísmo natural é provavelmente reconhecer que Deus não precisa da nossa ajuda. Nós O representamos como um Pai ocupado, ansioso, um tanto frustrado, correndo para lá e para cá procurando quem O ajude a realizar o Seu plano benevolente de paz e salvação para o mundo.

O Deus que opera todas as coisas certamente não precisa de ajuda nem de ajudadores. Um número excessivo de apelos missionários se baseia nessa suposta frustração do Deus Todo-Poderoso. Um pregador eficiente pode incitar os seus ouvintes a terem pena, não só dos pagãos, mas também do Deus que por tanto tempo tem procurado salvá-los e não o consegue por falta de apoio. Temo que milhares de jovens entrem no serviço cristão motivados apenas pela vontade de tirar Deus da situação embaraçosa em que o Seu amor o colocou, e da qual suas habilidades limitadas parecem incapazes de libertá-lo. Some-se a isso um certo grau de idealismo recomendável e uma boa dose de compaixão pelos menos privilegiados e teremos a verdadeira motivação de muitas das atividades cristãs hoje em dia.

Mais uma vez, Deus não precisa de defensores. Ele é o Eterno Não-Defendido. As Escrituras usam muitos termos militares a fim de comunicar-se conosco num idioma que possamos compreender; mas certamente não foi planejado que pensássemos no trono da Majestade como estando sitiado, com Miguel e seus exércitos ou outros seres celestiais lutando em sua defesa, para que não seja usurpado. Tal idéia seria compreender erradamente tudo que a Bíblia nos ensina a respeito de Deus. Nem o judaísmo nem o cristianismo poderiam aprovar tais conceitos pueris. Um Deus que precisa ser defendido, só poderia nos ajudar quando estivesse sendo ajudado. Só poderíamos contar com Ele se ganhasse a batalha cósmica entre o bem e o mal. Um Deus como esse não poderia ter o respeito de homens inteligentes; só poderia causar pena.

Temos de pensar dignamente com relação a Deus, se quisermos estar certos. Torna-se imperativo, num sentido moral, purificar nossas mentes de quaisquer conceitos ignóbeis sobre Deus, e permitir que Ele seja em nossas mentes o Deus que é no Seu Universo. A religião cristã abrange Deus e o homem, mas o seu enfoque é Deus e não o homem. A importância do homem está em ter sido criado à imagem de Deus; em si mesmo ele não é nada. Os salmistas e profetas das Escrituras se referem com triste desdém ao homem fraco cujo fôlego está em suas narinas, que cresce como a relva da manhã e seca, sendo cortado antes do pôr-do-sol. Que Deus existe em Si mesmo e que o homem existe para a glória de Deus é o ensinamento enfático da Bíblia. A grande honra de Deus está primeiramente no céu, como ainda há de estar na terra.

Com estes fundamentos começamos a compreender por que as Sagradas Escrituras dizem tanto a respeito da posição vital da fé e por que razão a incredulidade é tachada de pecado mortal. Entre todos os seres criados, nenhum ousa confiar em si mesmo. Só Deus confia em Si; todos os outros seres têm de confiar nEle. A incredulidade é a perversão da fé, pois não põe a sua confiança no Deus vivo, mas nos homens mortais. O incrédulo nega a auto-suficiência de Deus e usurpa atributos que não lhe pertencem. Esse duplo pecado desonra a Deus e finalmente destrói a alma do homem.

Em Seu amor e Sua piedade Deus veio a nós como Cristo. Esta tem sido a posição da igreja desde o tempo dos apóstolos. Ela se firma na doutrina da encarnação do Filho Eterno. Porém, mais recentemente, essa crença veio a ser interpretada de forma diferente e inferior ao que significava para a Igreja primitiva. O Homem Jesus tendo aparecido na carne tornou-se igual à Divindade, e todas as suas fraquezas e limitações humanas são assim atribuídas à própria Divindade. A verdade porém, é que o Homem que andou entre nós não foi uma demonstração da Divindade revelada, mas da perfeita humanidade. A terrível majestade de Deus foi misericordiosamente oculta no suave invólucro da natureza humana, para a nossa proteção.

“Desce, adverte ao povo que não traspasse o termo até ao Senhor para vê-lo, a fim de muitos deles não perecerem”, disse Deus a Moisés, e mais tarde: “Não me poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá a minha face, e viverá”.

Os cristãos de hoje parecem conhecer Cristo apenas na carne. Procuram ter comunhão com Ele, retirando dEIe a Sua ardente santidade e majestade inacessível, os mesmos atributos que ocultou enquanto na terra, mas assumiu totalmente na plenitude da glória, em Sua ascensão à destra do Pai. O Cristo do cristianismo popular tem um sorriso fraco e halo. Tornou-se “Alguém lá em cima” que gosta das pessoas, pelo menos de algumas pessoas, e estas são gratas, mas não estão muito impressionadas. Se precisam dEle, Ele também tem necessidade delas.

Não vamos supor que a verdade da auto-suficiência divina possa paralisar a atividade cristã. Pelo contrário, ela estimulará todo esforço sagrado. Esta verdade, embora seja uma repreensão necessária à autoconfiança humana, quando vista na sua perspectiva bíblica, tirará de nossas mentes o peso exaustivo da mortalidade e nos encorajará a tomar o suave jugo de Cristo e nos entregarmos à tarefa inspirada pelo Espírito para a honra de Deus e para o bem da humanidade. A mensagem abençoada é que o Deus que não tem necessidade de ninguém, em soberana condescendência Se curvou, para trabalhar através, dentro, e ao lado de Seus filhos obedientes.

Se isso tudo parece contraditório — Amém, assim seja. Os diversos elementos da verdade permanecem em perpétua antítese, por vezes exigindo que creiamos em coisas aparentemente opostas, enquanto aguardamos o dia em que conhece remos como também somos conhecidos. A verdade que ora parece contradizer a si mesma se elevará então em unidade resplendente e veremos que não houve jamais conflito nessa verdade, mas ele ocorreu apenas em nossas mentes debilitadas pelo pecado.

Até aquele dia, a nossa satisfação íntima estará na obediência amorosa aos mandamentos de Cristo e às admoestações inspiradas dos Seus apóstolos. “Deus é quem efetua em vós.” Ele não precisa de ninguém, mas quando a fé se faz presente Ele opera através de qualquer um. Há nesta sentença duas afirmativas, e uma vida espiritual saudável exige que aceitemos ambas. Durante toda uma geração a primeira afirmativa tem estado num eclipse quase total, e isto prejudicou profundamente nossa espiritualidade.


Fonte:Meditando em Jesus

Nenhum comentário:

Postar um comentário